terça-feira, 3 de junho de 2008

Conhecer JOHN STEINBECK

Um homem tem de ter qualquer coisa a que se ligue, qualquer coisa que ele possa estar certo de encontrar lá de manhã.


Costumo reler os livros de que gosto várias vezes. De cada vez que o faço, descubro coisas que, antes, me tinham escapado. A evolução contínua a que estamos sujeitos alarga os nossos horizontes e, de cada vez que lemos, somos sempre um novo leitor com uma nova interpretação da obra. Por isso, um bom livro é uma fonte inesgotável de sabedoria.

Acabei de ler, pela enésima vez, o “A Um Deus Desconhecido”, do John Steinbeck. Nunca, como agora, compreendi a força de Joseph Wayne e o seu amor desmedido pela terra. Uma terra dependente da chuva, como ele da própria terra. E de como essa telúrica e trágica dependência o transformou num ser solitário e sofredor. A chuva e a terra, fontes de vida que, por vezes, negam essa vida, lançam, irremediavelmente, o homem impotente na prática de ritos propiciadores da abundância desejada. Simples superstição desesperada ou necessidade de comunicação com as forças ocultas que controlam o nosso destino? Talvez reminiscências de uma época remota, onde o maravilhoso fazia parte do quotidiano das pessoas, e que se perdeu.



[…]
Rama continuou: “Não se há homens nascidos fora da humanidade, ou se alguns homens são tão humanos que façam os outros parecer irreais. Quem sabe se um deus em miniatura vive na Terra de vez em quando? Joseph tem uma força inquebrantável; tem a calma das montanhas, e as suas emoções são tão primitivas, tão ferozes, tão súbitas, como o relâmpago – e, até onde posso ver ou saber, exactamente tão falhas de razão como ele. Quando estiver afastada de Joseph, tente pensar nele e verá o que eu quero dizer. A figura dele tornar-se-á gigantesca, até ultrapassar as montanhas; e a sua força será como o mergulho irresistível do vento. Benjy morreu. É impossível pensar que Joseph morra. Ele é eterno. O pai morreu, mas não foi uma morte.” A boca de Rama movia-se impotente em busca de palavras. Gritou, como ferida duma dor súbita: “Digo-lhe eu, esse homem não é um homem, a menos que seja todos os homens. A força, a resistência, o raciocinar lento e laborioso de todos os homens, e toda a alegria e sofrimento, aniquilando-se mutuamente, mas permanecendo no resíduo final. Ele é tudo isto: o repositório duma pequena parte da alma de cada homem e, ainda mais, um símbolo da alma da Terra. […]
Elizabeth […] não queria olhar para Rama. “Você ama o meu marido”, disse numa voz sumida, acusadora. “Você ama-o e sente receio.”Rama levantou os olhos lentamente; voltou a baixá-los. “Não o amo. Não há qualquer possibilidade de ser correspondida. Adoro-o; não há necessidade de ser correspondida nisso. E você adorá-lo-á, igualmente sem nenhuma recompensa. Agora já sabe, e não tem motivo para receios.”

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